Wednesday, May 5, 2010






Jorge Santayana, "Filosofia da Viagem"






Perguntar, como um escritor de língua alemã, onde se está em casa - no lugar onde se nasceu, ou naquele onde se deseja morrer, é formular a mesma coisa em dois momentos diferentes da vida humana, o nascimento e a morte. Entre esses dois momentos, a extensão de uma vida, um movimento em direcção a uma maior consciência. Por um lado, a necessidade humana da casa, do lar, da origem e da finalidade, do destino; por outro lado, a existência humana como viagem, como percurso entre dois portos.


No seu ensaio "Filosofia da Viagem", Jorge Santayana distingue os seres humanos das plantas justamente pela sua capacidade de locomoção. A essa capacidade estaria ligada a inteligência. Assim, mais do que às mãos, o ser humano deveria a sua inteligência aos pés. Aqueles que pensam sentados, para além disso, com olhos fixos no vazio, escreve o ensaísta, consomem-se no sonho, em imagens de coisas remotas e na neblina da memória; ao passo que pensar caminhando nos faz avisados, alerta, ponderando coisas reais na sua ordem real.


Depois de considerar os vários tipos de viajante, desde aquele que nasce - condição da condição humana - passando por aquele que emigra, pelo exilado, pelo explorador, colonizador, pelo mercador, e ainda pelo vagabundo, mas também pelo alpinista, pelo caçador, pelo desportista, até ao último e mais moderno tipo de viajante, o turista, seja ele excursionista ou peregrino, de todos estes dilectos de Hermes o ensaísta afirma: "é sábio deslocar-se o mais frequentemente possível do mais conhecido ao mais estrangeiro: conserva ágil a mente, destrói os preconceitos e fomenta a alegria."


No entanto - e salvaguardando também as viagens que é possível fazer sem nos deslocarmos no espaço, como será o caso da navegação neste blogue, conclui Santayana: "O coração humano é localmente finito e tem raízes: e se a inteligência irradia dele, segundo o seu vigor, para distâncias cada vez maiores, o aprendido, para ser conservado, há-de ir parar a esse centro."


Terá a casa um papel semelhante ao que Santayana atribui ao coração? Se assim é, que responsabilidade a dos senhores arquitectos! Eles, melhor do que ninguém, poderiam glosar o tema. Para nós a "casa" será este centro aqui criado, o blogue que hoje iniciamos, dentro do qual as minhas crónicas à volta do globo serão modestas propostas de conversa e construção. Não prometo uma volta ao mundo, muito menos em 80 dias, na verdade nem prometo nada, apenas partilhar convosco aquilo que me parecer digno de menção. Começo em breve, até já!


(2005)
Créditos da imagem: http://www.galeon.com/